domingo, 7 de novembro de 2010

A bárbarie como justificativa do preconceito

Em 1808 D, João VI chegou ao Brasil, fugindo da guerra napoleônica que invadiu Portugal. Neste mesmo ano, o Rei ordenou a guerra contra os nativos brasileiros chamados por eles de “botocudos”, termo que na realidade não designa uma nação ou etnia. É uma referência aos “botoques”, os ornamentos utilizados pelos nativos. Na carta na qual ordenou o massacre, D. João VI os designou como “bárbaros” antropófagos. A antropofagia não era genérica, mas parte da tradição de algumas nações nativas brasileiras que acreditavam adquirir características desejáveis através da ingestão de certas partes do corpo do inimigo, como a inteligência ou a força.

Vários autores classificaram como “bárbaros os africanos” as pessoas trazidas como escravos para as américas. O fato de serem considerados “bárbaros” justificava a escravidão de tais povos.

No Brasil, os índios foram massacrados sem piedade. Não só com armas, mas com uma guerra biológica onde, deliberadamente os portugueses invasores espalhavam doenças terríveis como a varíola em utensílios infectados deixados por eles. Da mesma forma, os escravos não eram tratados como gente, mas como animais de carga, sem direito à compaixão. A igreja nunca disse nada sobre este tratamento desumano a seres humanos pelo fato de serem, tanto os índios como os africanos, “bárbaros”.

Quando saimos do Brasil, vemos referências a atrocidades cometidas contra seres humanos onde a jutificativa para a opressão contra pessoas é classificá-las como “bárbaros”.

Mas o que significa a palavra bárbaro?

A palavra tem origem muito antiga, ainda na grécia e significa os povos “não gregos”. Esta palavra foi utilizada também pelos romanos para designar povos não romanos. Tanto gregos como romanos justificavam a guerra, a escravidão e a falta de compaixão para com o ser humano por estarem tratando com “bárbaros”. Tratar algum ser humano como bárbaro é o que hoje chamos xenofobia, que quer dizer a mesma coisa: xénos é estrangeiro e phóbos, medo. Medo de estrangeiros, de pessoas diferentes na aparência, língua ou cultura. É uma anomalia, um desvio mental ou comportamental que precisa ser tratado.

No Brasil, os não-europeus tratavam como “bárbaros” todas as etinias que tivessem características diferentes das européias. E assim também acontece com outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, Charles Chaplin lançou o filme “O Grande Ditador”, onde criticava a discriminação existente na alemanha contra judeus, ciganos, homossexuais e outros "bárbaros". No discurso final do filme, faz uma apologia à tolerância entre os povos. E o filme não foi, inicialmente, bem aceito. Afinal de contas ele estava criticando germânicos e defendendo árabes, ciganos e judeus. Isto era inconcebível, já que o sentimento xenófobo foi criticado.

Auida hoje vemos esta aversão e, às vezes, ódio pelo diferente. Inclusive no Brasil. Preconceito contra negros, contra religiões que não sejam cristãs, contra homossexuais, contra sul americanos, contra imigrantes em geral, inclusive contra nordestinos, contra tudo que não faça parte do ideal do descendente de europeu morador das regiões sul e sudeste ou até mesmo contra pessoas que tenham uma maneira diferente de pensar.

Para estas pessoas, recomendo tratamento. Para o tratamento da xenofobia são normalmente utilizados os métodos da terapia comportamental. O princípio desta terapia no que concerne às fobias, é o da exposição ao objecto ou situação fóbica. No caso particular da xenofobia, será a exposição do doente a situações estranhas que ativam sua fobia. Assim sendo, o sujeito vai descobrir que tal situação aterrorizadora, não representa qualquer perigo ou ameaça como ele imaginava. Para tanto, o sujeito deve aprender determinadas técnicas para lidar com a ansiedade ou angústia que sente em relação ao encontro com pessoas desconhecidas. De todos os métodos comportamentais, a dessensibilização sistemática parece ser o que melhor resulta no tratamento da xenofobia, uma vez que a exposição à situação ou objecto fóbico é gradual.

Aconselho ainda a leitura do texto de Charles Chaplim em “O Grande Ditador”:
"Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar – se possível – judeus, o gentio... negros... brancos.
Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo – não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades.
O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.”

2 comentários:

  1. Pois é...os primeiros a serem chamados de "bárbaros" foram os poloneses, o povo mais antigo da Europa. Também...escutar poloneses é como escutar "br..brbr..br". Eles nunca foram dominados por Roma, só sucumbiram pela invasão russa, terrivelmente atacados. Os judeus, outro povo odiado por nada, eram enviados para Polônia como "castigo". Os poloneses odiavam judeus. Ainda odeiam. Os judeus s~~ao a menor nação árabe, apenas um Estado na Arábia...mesmo assim, cercado de ditadores, são odiados por sua democracia.

    Pelo menos o sistema político das diversas etinias indígenas que estão ou estiveram no Brasil, não contaram com ditadores entre eles...

    O totalitarismo presente nas ideologias comunistas é assim, divide a humanidade entre "raças".

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  2. Bem antes da perseguição aos poloneses outros povos foram perseguidos e escravizados.
    Os judeus foram vítimas da Igreja Católica muito antes da perseguição pela extrema-direita, que costuma perseguir "bárbaros", como o fascismo e o nazismo. Temos outros exemplos em regimes tidos como democráticos como a Klu Klux Kan, nos Estados Unidos, que perseguiram pessoas negras ou, mais recentemente, Sarcozi, na França, que expulsou ciganos.
    Chamar todas as nações árabes de ditaduras é uma forma de xenofobia, que taxa de ditadores quem não seguem seus "princípios". E quanto aos judeus, existe uma parcela da população que ataca os palestinos, taxados de "bárbaros" por esta parcela da população israelense, da mesma forma que uma parcela de maus mulçumanos atacam judeus com a mesma alegação.
    É difícil falar em tolerância, mas é preciso. Regimes totalitários realmente facilitam a discriminação, mas a acusação de totalitários nem sempre corresponde à realidade. Diálogo e tolerância devem sempre pautar nossas ações.
    Concordo com Chales Chaplin... Não à discriminação. Afinal de contas, todos nós pertencemos à mesma raça: à raça humana.

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